sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Deslimite


 
Cercas brilham
quando são
ignoradas
 
amam corças
e crianças
 
levadas
por pernas
longas
 
e deslimites.

sábado, 23 de novembro de 2013

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Farsa do punho

 
Aquarela de Ivanda Lucia Oliveira




A tola
farsa
safa-se
alegórica?

Uma boa farsa
tem um que
que leva a crer

quem de nada entende...
patina superficialmente

cuem
quem
cuem

tem
cachaça
na lagoa

o pato
tonto


cobra
de punho
fechado

e chama
de tromba amiga
cuem

o pato
é devorado...

quem partiu
-
se

partido
ficou

nesse punho
fechado do agora
nunca coube flor

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Cara pálida



Evoco a primavera
tenho cara desperta
uma índia me ri

invade-me
uma índia com
cara de guerra...                                                      
 
 
    

                                                                                
Veio o frio
de um amarelo pardo
cor de burro amansado...

Fazer o burro negar
guerreiro
a carga milenar...

Fazer cor                                                                 
que chama o touro
chama a luta
chama.

Nega
a certeza da queda
a lei
a gravidade

nega!

Se tudo é farsa

    revela fada
    desafia e plana
    guerreia pluma
    resiste fera

                               s e m t r a m a s s u m a

Foi uma índia
foto que vi

e tenho pele
de branca

manca de milhões
de primaveras...


Nas fotos -  Criança e Princesa Isabel, a mais velha índia da aldeia pataxó de Barra Velha - BA

A caverna de Clarice - uma novela em muitos capítulos


 

Essa é uma obra de ficção. Semelhanças com minha vida não são mera coincidência.

 
I


A poeta anda confusa... Com tudo... Quase todos... Fazia tempo que não sentia esse desânimo com a superfície do mundo. Vinha trafegando por ela como alguém que no início teve que tomar um remédio amargo e aos poucos até passou a achar gosto belo.  Saia... Pintava os lábios, voltou a sonhar com abraços... Se perguntada, deitada na cama, olhando o teto, não saberia dizer a hora exata em que o mel virou fel. Ela abre a janela do quarto... O céu é de um azul que venta.  Escreve um bilhete pra filha: tem macarrão no forno, te amo. Fecha os olhos e se dirige para a caverna. Sabe que estocou pensamentos para muitas vidas.  Abre a porta, nenhum cômodo está empoeirado e lentamente hiberna...

18/11/2013
 
 
II
 

A caverna tem uma luz natural que vem do teto. Uma pequena abertura que lhe permite folhear lembranças. A sala das recordações não tem cheiro de mofo. Ela senta e com as mãos desenha o passado no ar.  Se vê, saia longa, tranças, em meio a um grupo de amigos que gritavam em alto falantes, pedindo as diretas já... 1º de junho de 1984...
Era dia do seu aniversário. Não sonhava festa melhor... “Um dia é do caçador... o outro é da caçarola... Abre a janela... bate panela”... Lembra que imaginava como seria doce votar. Ela sonha com um país socialista... Muitos amigos em Cuba... Alguns em guerrilhas... Os quadros da memória pulam sem sequencias. Lembra-se da decepção e da espera... Mais cinco anos para estar frente às urnas... Ela tremia... O gosto de escrever o nome do homem que nunca seria eleito, Roberto Freire, e que depois, como outros que viriam, a decepcionaria... Por um tempo fica imaginando porque, entre tantas memórias, essas foram as que vieram primeiro...
Não se importa, sabe que voltará a esse cômodo e se prepara para ir à sala das dores...
     
 
19/11/2013  
            


III


Enquanto caminha, percebe que já escureceu. A luz que vinha do teto foi substituida por pequenas estrelas.  Sabe que lá fora um dia se passou e tenta imaginar motivos para voltar. A filha está viajando, ela lembra, e mergulha mais fundo na caverna. Pensa ter ouvido uma voz, mas não, estava distante... Talvez em outro tempo.
Os corredores estão lotados. É uma bagunça que agrada aos olhos.  Lembra-se da última vez que esteve aqui, não havia tantos desenhos, fotos, versos, rabiscos, espalhados pelo chão. Ela encontra uma caderneta com os nomes que gostaria de ter tido. Folheia. Escolhe o primeiro, mastiga. O papel tem o gosto do giz que ela costumava comer na escola até um dia, vomitar... Na caverna será Clarice.
Decide abrir as portas dos cômodos e derrubar as paredes. Não há mais separação entre os sentimentos...

 
20/11/2013


 

IV

 
O chão da caverna não é liso. Agora, sem as paredes que separavam emoções, Clarice percebe a imensidão.  Minha terra do nunca, ela ri... Um riso que some ao perceber que lá dentro, coisas envelheciam... O gosto do papel engolido, com seu novo nome, agora adquiriu um sabor metálico. Sentada ela revira desenhos. Alguns se desfazem em seus dedos... Estão velhos, muito velhos... Clarice fecha os olhos já fechados e vomita. Seu corpo treme, esperava a eternidade no abrigo... Um pequeno desenho resiste ao seu toque... 1982... Lembra... Foi quando conheceu o homem que seria seu marido e que por 27 anos dividiria a viagem.  O desenho, um nanquim aquarelado onde o casal, traço infantil, está sentado num tronco... Cabeças juntas, olhando a cachoeira... Tororó, ela diz em voz alta e o eco que volta é grave... A memória do tempo com esse homem é feita mais de estrada do que cama. On the roads eram os dias... Clarice não sabe, mas aquele que está escondido nas sombras vê seu rosto brilhar. Na hora certa, talvez ele se apresente.  Ela decide ficar mais um dia...
Encosta a cabeça na almofada que um dia bordou e sonha que dorme...
 
 
21/11/2013
 
 

V
 

Quando acorda, pensa em  fazer o café forte de toda manhã. Leva alguns segundos para lembrar onde está. Terá café na caverna?  Clarice não sabe quanto tempo se passou, mas as pequenas estrelas foram substituidas por fiapos de luz que agora formam desenhos no chão craquelento.  Procura os cigarros no bolso, o que veste é uma camisola azul... Sem cigarros não dá... Lamento baby, mas sem eles interrompo a viagem... ri. Ela se lembra de quando começou a fumar e de como uma vez tentou parar... Conseguiu e também conseguiu ficar quase um ano sem escrever o que quase a matou, de tédio e desânimo.  Encontra os cigarros numa estante de madeira, acende com alívio.  Decidi fazer uma caminhada, explorar a caverna que agora está modificada sem as paredes que separavam os comôdos. Não se lembrava de como era imensa...

Resolve trocar de roupa, apesar de achar que estava sozinha na caverna que tinha criado... Encontra uma calça de moleton azul, uma camiseta azul e o tênis velho de camurça. Está pronta para a exploração.  Em algum ponto de sua mente passa a lembrança de que tinha planejado despertar na cama. Que dia será hoje? De repente não se importa mais, reencontrou sua caverna, sua caverna e sabe que precisa continuar. Começa a caminhar e quase tropeça na garrafa.  O que a fez não derrubar a garrafa quente de um café novo, foi a voz que ouviu....de longe...muito longe... Mas ela entendeu as palavras – Bem vinda de volta –

Sente um calafrio, abaixa, vê o bilhete. “Um café forte pra sua jornada" A letra não era sua, não... não mesmo... De repente ela sabe que não está sozinha...
 
23/11/2013


VI

 

A letra do bilhete lembra caracteres dos péssimos filmes, baseados na obra do Sthepen King. Clarice era poeta, não escreveria obras longas...não...não senhor, gostava dos escritos concisos, mas Stehepen King? Esse era mestre, a acompanhou em muitas entediantes viagens de carro e ônibus. “IT”, o que ela mais gostava, havido lido e relido.  Sim, a letra no bilhete tinha uma escrita curva, sombria...Não era sua, não mesmo. Pensou se um dia teria tentado imitar esas letras, fizera tantas coisas, mas não...quando começou a escrever já foi logo pra máquina, a primeira uma vermelha, ela não gravou o nome, ainda a tem, talvez em algum canto da caverna e sua querida, uma preta praxis 20, adorava a letra courier. Aquele bilhete era escrito a mão, ainda tinha cheiro de tinta. Ela o tocou, estava úmido. Quem ou o que o tivesse escrito não poderia estar muito longe. Clarice sentiu arrepios... Como assim? É minha caverna...minha. Nunca ninguém esteve aqui comigo e fui eu que a criei...
Por instantes ela sente uma onda de terror e então se lembra de que é só acordar e estará na cama, sua cama quentinha, seu cobertor, a filha que deve chegar de viagem, seu projeto para o próximo livro...sim...é só acordar... Então ela tenta... Fecha os olhos e diz em voz alta: quero estar na cama...sente um vento frio...abre os olhos e continua na caverna. Um momento de puro terror a invade. Tenta de novo, dessa vez com mais firmeza, mais séria... Toca o chão , ainda é craquelento. Então ela chora... Estou presa dentro de mim, diz e o som dessas palavras a faz rir. Quem foi o maluco que disse que a loucura se desfaz no exercício da razão, Bertrand Russel, talvez... Ela decide que só está nervosa, só muito nervosa... Abre a garrafa de café, enche uma chícara com desenho de coruja e se prepara para beber.
 
25/11/2013
 

domingo, 17 de novembro de 2013

Hoje pintei o domingo ...de novo...



 
 
Asa
só pesa
quando molha

Gente
quando
é ave
  
olha de paz
para o sol
 
Seca
e mergulha
 
 na onda
das nuvens.

Hoje pintei o domingo



Posso
sumir
agora

nesse
movi (e)
mento

a direção
é minha

monologolento.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Poeminha independente

 
 
 
 
Sente
o passeio
tudo
é assunto
 
nesse
presente
o passado
mudo.



Foto tirada no dia 17-junho-2013
Brasília.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Mergulho


 
Acolho
o lado
escuro
 
agora
que o
sei
 
salta
iluminado.
 
Aceito...
 
Para ser,
mergulho.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

O passado passeia por mim





Crepita
a fogueira

a memória
é chama.

            No colo,
            a infância
            arde

...vermelha
noite...

Pergunto
ao vento,
 
o fogo
que nunca apagou

será o mesmo
que começou?

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Ponto de vista


Bem de perto
olhei meu rosto
no espelho
 
  Ai!
  Cara de cavalo
  enrugada!

fui me afastando
afastando...

  Ah!
  Que belo cavalo
  dançando.



Bien cerca
miré mi rostro
en el espejo:
 
   ¡Ay!
   ¡Cara de caballo
   arrugada!

 Me fui alejando
alejando…
 
   ¡Ah!
   ¡Que bello caballo
   bailando!


(trad. Suzana Outeiral)

sábado, 9 de novembro de 2013

Outono da lua



Pés não são alados
pisam folhas
que estalam...

A lua cheia
é voraz

seu ofício
não satisfaz,

a falsa branca
nesse outono
quer mais...

O que faz
é incorporar
o dragão na luz

quando chora
é fogo
amarelo...

É outono
tempo de tatuar
a paz nas crateras.


Foto: Jardim Botânico de Brasília com Luli e Lucina

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Passagem submersa



Invado
campos
minados

o risco menor
são os dardos
do esquecimento.

Tombados
estão os ombros

contra a lei
da gravidade

inutilmente
luto.

Tombados
estão
os ombros.

A mente
alça vôos
submersos

nas asas
de uma ave
que contra a luz
rasga o branco  céu.



terça-feira, 5 de novembro de 2013

Dias de paz

 
 
 
 
É outono
o chão é roxo                                          
olhos paisajam sonhos.

A paciência trabalha
cintila sob os pés

onde esmago
os calos
do inverno.

domingo, 3 de novembro de 2013

Abandonada lucidez...



No passeio
o tapa
de um passado
 
no banco,
abandonado...
 
A luz
é fiapo de sol
 
a memória
mergulha
na sombra
 
a lucidez
não precia de mim...
 
*********
 
on the ride
the slap
of a past

in the bank,
abandoned ...

light
is a sun wire

memory
plunges
in shade
 
lucidity
need not
from me.

Os anjos cochilam...



Um coco
rolando
na terra do mar

rolando nas mãos do negro
que enrola os cachos negros
sobre a cabeça que rola negra
sobre o negro mar...

Há lugar?
Ou vida é só
derivar...

No porto o velho que já voltou
ento uma cantiga de ninar...

   Dorme snaila
   menina blue

   é hora de sonhar com os anjos
   os anjos que são cães

O velho e o moço
adormecem

vara na mão,
desarmados...

sábado, 2 de novembro de 2013

Calos





Inútil esteira
bacia com água morna
 
meus pés preferem
 abrir caminho
na mata do medo
 
minhas mãos arrancam
os elogios da memória.




(trad. Suzana Outeiral)
Inútil estera
vasija con agua tibia,
 mis pies prefieren abrir camino
 en la selva extraña
 mis manos arrancan
los elogios de la memoria.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Leve noite


Acordo
anoto o poema
da noite.
 
Sonhando
faço versos
livres.
 
*******************
 
Fez silencio no peito
a cara calou seus trejeitos
um gesto confiante
recebeu a noite
 
      os sujeitos de dentro
      adormeceram.